Quem achava que a crise política acabaria com o impeachment e recesso de fim de ano?

  • Por:Ibsen Costa Manso
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No final de 2005, em pleno estouro do caso do Mensalão, o ex-presidente Lula amargava baixíssimos índices de popularidade. Praticamente ninguém acreditava que ele poderia se reeleger no final do ano seguinte. Em palestras e relatórios para clientes, em outubro daquele ano, mostrei outro cenário também factível e um tanto divergente das análises de então. Para surpresa de muitos: Lula poderia, sim, ser reeleito.

 

A economia ia relativamente bem, a opinião pública estava anestesiada com tantos escândalos e não apareciam mais fatos novos. O Natal seria bom, haveria o recesso no Congresso e férias até a Quarta-feira de cinzas, como de costume. Além disso, alertei para o iminente lançamento do Bolsa Família, o que pouquíssima gente sabia, e que previa a distribuição de R$ 11 bilhões para 44 milhões de pessoas das classes D e E, que, à época, formavam quase a maioria do eleitorado brasileiro. Não deu outra: no início de 2016, Lula começou a se recuperar do desgaste de imagem e saiu mais uma vez vitorioso das urnas de outubro.

 

HOJE É DIFERENTE

Em junho do ano passado, ainda como interino na presidência da República, Michel Temer anunciou um reajuste de 12,5% nos benefícios do Bolsa Família, a partir de julho (a presidente afastada Dilma Rousseff defendera um aumento menos, de 9%), com impacto de R$ 2,5 bilhões por mês na folha de pagamentos do programa. O Orçamento de 2017 prevê um desembolso de até R$ 29 bilhões para, estima-se, mais de 52 milhões de pessoas.

 

Se, a exemplo de Lula, o objetivo de Temer era se tornar popular, verificar-se-ia logo depois que ele deu com os burros n’água. Os tempos são completamente outros…

 

O País encolheu, a economia vai de mal a pior, o desemprego só aumenta, a inflação ainda está alta e os juros seguem estratosféricos, embora alguns indicadores já apresentem evolução positiva. Contudo, as vendas no Natal nos shoppings neste ano caíram 3% em relação a 2015, quando ocorreu um tombo ainda pior, na comparação com o período ano anterior (pior resultado desde 2003).

 

Alguns ainda acreditam que teremos um ambiente econômico e político um pouco melhor a partir do segundo semestre, ou, quem sabe, em 2018, quiçá em 2019, no pós-eleições. Há controvérsias. Depende de quem for eleito, como já afirmei várias vezes aqui.

 

A IMPOPULARIDADE É BOA PARA TOCAR AS REFORMAS, DISSE NIZAN

Após o impeachment de Dilma, ao assumir “definitivamente” a presidência, Temer naufragou nas pesquisas de opinião. No Ibope, ele obteve o mais baixo Índice de Confiança Presidencial (IC) para um início de governo (27%). Isso desde o início da série histórica, que vem de março de 1986 (José Sarney, após a comoção com a morte de Tancredo Neves, largou com 86% de IC; depois afundou até as regiões abissais, mas isso já é outra história).

 

Em seu segundo mandato, Dilma Rousseff subiu a rampa do Planalto com 51%. É a vice-campeã em impopularidade para um começo do governo desde a redemocratização, segundo o instituto.

 

Agora, mais uma má notícia para Temer: sua tendência é de queda. Nos dois levantamentos seguintes, levados a campo em setembro e dezembro, ele caiu para 26%; e depois para 23%, respectivamente. E se não bastasse a crise econômica, batem à porta de seu gabinete as delações premiadas da Odebrecht, apenas para citar uma das empreiteiras atoladas num esquema de corrupção histórico, não apenas neste País.

 

O lado bom? Temer conta, pelo menos teoricamente, com ampla maioria em sua base aliada no Congresso (lembrando que algumas centenas de parlamentares também estão às voltas com a operação Lava-Jato). Ele conseguiu aprovar projetos polêmicos, como as novas regras para a exploração do pré-sal e o limite do teto de gastos públicos. Já se conseguirá emplacar as reformas trabalhistas e da Previdência ainda este ano são outros 500. De qualquer forma, mesmo que consiga, o que a muitos parece fundamental para o futuro do País, certamente amargará ainda mais desgaste popular.

 

OS FATORES ACIDENTAIS DA CRISE

Tudo o que Michel Temer mais sonhava neste fim de ano, nas areias de Mangaratiba, era poder descansar no recesso do Legislativo e do Judiciário. Daí, estouraram (não por acidente, presidente) as rebeliões nos presídios no Amazonas e em Roraima, com quase uma centena de presos assassinados por rivais. Em princípio, o governo federal fez que o problema não era com ele. Temer resolveu se pronunciar só depois do Papa. E se deu mal.

 

Quando explode alguma bomba dessa magnitude, as primeiras reações e a busca de soluções costumam seguir essa mesma linha estratégica. Veio de novo a pergunta: afinal, será que a Segurança é uma questão municipal, estadual ou federal? Acontece que, para a população, que paga impostos nos três níveis, a responsabilidade acaba sempre sendo atribuída a todos os governantes, aos parlamentares e, especificamente neste caso, até mesmo à Justiça.

 

Foi mais ou menos o que aconteceu quando do aumento das passagens do transporte público em 2013, que deu origem a protestos, de início locais, com pequenos grupos, mas que terminaram com grandes manifestações e as lamentáveis depredações em todo o País, principalmente em Brasília.

 

Só para lembrar, já há mais uma série de reajustes em andamento na praça, em plena crise. Enquanto setores do funcionalismo público são agraciados com revisões salariais, inclusive com bônus por desempenho para servidores aposentados.

 

Toda vez que um governo se vê assim enrascado, a solução encontrada é simples: convoca-se uma reunião urgente do gabinete, forma-se um grupo de trabalho e se apresenta um plano de emergência.

 

A CARTOLA DE SOLUÇÕES

Em 2000, FHC anunciou um Plano Nacional de Segurança Pública, depois de uma ação desastrada da polícia durante o sequestro do “Ônibus 174”, no Rio de Janeiro.

 

Para quem não se lembra, ou não viu os filmes de José Padilha e Bruno Barreto, o meliante Sandro do Nascimento, sobrevivente da chacina da Candelária, em 1993, usou como escudo a professora Geísa Firmo Gonçalves. Um integrante do BOPE tentou resgatá-la com uma sub-metralhadora. Errou o alvo e acertou o queixo da refém. Sandro, então, disparou três tiros de revólver calibre 38 nas costas de Geísa, que morreu na hora. O bandido foi dominado e lavado num camburão, onde foi morto por asfixia pelos policiais. Em tempo: ninguém foi considerado culpado pela tragédia.

 

Em 2003, logo após ser empossado na Presidência, Lula anunciou com grande estardalhaço um novo Plano Nacional de Segurança, com 28 pontos, que haviam sido apresentados como promessas na campanha eleitoral. Entre os itens, por exemplo, estava a velha proposta de unificação das polícias estaduais.

 

Em 2011, e também em 2015, foi a vez de Dilma apresentar sua carta de intenções para o setor. No primeiro mandato, um dos programas foi batizado de “O Brasil mais seguro”. No segundo, o “Plano” chegou a ser levado ao Congresso, com toda a pompa e circunstância.

 

E não é que agora, depois de novamente rolarem cabeças em mais uma barbárie no sistema prisional, surge mais um pacote, com várias das mesmíssimas ideias, sem metas claras, nem prazos?

 

Como diria o Gaspari, ganha uma semana num presídio de segurança máxima quem apontar meia dúzia de medidas que saíram do papel nos últimos 20 anos; ou que serão implantadas nas próximas duas décadas. O prêmio vale também para incontáveis Planos Nacionais de Transportes, Saúde, Educação, Habitação, Reforma Agrária. etc..

 

Com tantos escândalos, desperdício de tempo e dinheiro,  inoperância e incompetência na gestão da máquina pública, com tantas promessas falsas ou inexequíveis, em todas as áreas, é mesmo realmente difícil que um governo, qualquer um, chegue ao final com alta popularidade.

 

Para terminar, voltando à política e a Michel Temer, ele ainda tem esquentado a cabeça nas férias, além de tudo, com a sucessão na Câmara, pedidos de impeachment e ações no TSE que pedem sua cassação. Não vou me delongar mais sobre esses assuntos. Estão em vários posts anteriores e há meses nos meus relatórios.

 

SQS*, parecia fácil e favorável resolver a crise. SQN*

 

*Para quem não sabe, essas siglas não têm nada a ver com os famosos endereços das superquadras de Brasília. São gírias, abreviações que circulam nas redes sociais. SQS=só que sempre; SQN = só que não

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