O que sobrou e o que vem por aí depois do impeachment?

  • Por:Ibsen Costa Manso
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O quebra-quebra realizado por manifestantes contrários ao impeachment não é nada. Você não imagina o pugilato verbal e a quantidade de escombros que restou depois da votação de ontem aqui em Brasília.

 

A ressaca é tamanha que a próxima sessão do Senado só foi marcada para a quinta-feira da semana que vem. E isso porque duas Medidas Provisórias vitais para o governo perderão a validade por decurso de prazo se não forem aprovadas até lá: a da reforma administrativa, que reduziu o número de cargos e de ministérios, e o de criação da Secretaria do Programa de Parcerias de Investimentos. Moreira Franco, titular da pasta, que corre o risco de ser despejado, é fiel escudeiro de Michel Temer e sogro de Rodrigo Maia, presidente da Câmara.

 

Se não fosse pelas MPs, com um feriado de Sete de Setembro em plena quarta-feira, é provável que boa parte dos senadores só voltasse a Brasília depois do dia 13. Sem falar nos que poderiam nem vir mais até outubro, por já estarem envolvidos nas campanhas das eleições municipais.

 

A votação dessa medidas será o primeiro grande teste do novo governo ― e a base aliada se encontra absolutamente conflagrada.

 

A situação hoje no País é simplesmente sui generis. Dilma Rousseff (PT-RS) perdeu o cargo de presidente, mas não, pelo menos em princípio, o direito a disputar eleições e ocupar funções públicas. Recém-empossado, Michel Temer (PMDB-SP) arrumou as malas e partiu para a China (apenas parte da crise viajou com ele). Rodrigo Maia (DEM-RJ) é o presidente interino da República e Waldir Maranhão (PP-MA) reassumiu temporariamente a presidência da Câmara.

 

Esperava-se uma comemoração completa para os peemedebistas; e um fim de festa para os petistas. Restou na boca de todos um certo gosto amargo de bebida de má qualidade.

 

O risco jurídico aumentou com o fatiamento da pena de Dilma. A defesa da ex-presidente já havia anunciado que entraria com recursos no STF. O Planalto e líderes do DEM e do PSDB, como de costume, titubearam sobre a oportunidade de questionar, ou não, o destaque com a questão da inabilitação para funções públicas de Dilma. O temor é que, acionado, o Supremo poderia cancelar a votação em sua totalidade. Nesse caso, Dilma poderia voltar a ser presidente afastada e Temer se transformaria mais uma vez interino. Seria então necessária uma nova sessão de julgamento do impeachment.

 

O Solidariedade chegou a anunciar ontem mesmo que iria entrar com ação, com o intuito de punir a ex-presidente com a íntegra do parágrafo único do art. 52 da Constituição: “Nos casos previstos nos incisos I e II, funcionará como Presidente o do Supremo Tribunal Federal, limitando-se a condenação, que somente será proferida por dois terços dos votos do Senado Federal, à perda do cargo, COM inabilitação, por oito anos, para o exercício de função pública, sem prejuízo das demais sanções judiciais cabíveis.

 

O texto em negrito é exatamente o que foi destacado na manobra de votação engendrada pelo PT, com apoio de lideranças estreladas do PMDB e o aval do presidente do STF, Ricardo Lewandowski, que demonstrou estar preparadíssimo desde sempre para discutir o imbróglio.

 

O PT, como já era esperado, entrou com o requerimento do destaque. A senadora Kátia Abreu (PMDB-TO) fez um discurso pedindo clemência para Dilma. Argumentou que a ex-presidente não conseguiria sobreviver com uma aposentadoria de R$ 5 mil e que precisará trabalhar (no setor público). Renan Calheiros pediu a palavra, disse que “depois da queda, desnecessário é o coice” e antecipou seu voto pró-redenção de Dilma. Antes havia votado pela perda do mandato. Ou seja, foi uma no cravo, outra na ferradura, para usar expressão similar. Senadores de seu grupo seguiram o comando. O resto é o que se sabe.

 

As surpresas deixaram muita gente atônita no plenário. Ficou absolutamente clara a jogada bem combinada desde a véspera. O que não se disse abertamente é que o precedente poderá eventualmente também beneficiar Eduardo Cunha e outros envolvidos na Lava-Jato.

 

No Palácio do Planalto, já empossado, Michel Temer reagiu indignado e afirmou que “não será tolerada essa espécie de conduta” e que “quem não quer que o governo federal dê certo, declare-se contra ele e saia”. De duas, uma: ou realmente Temer não foi avisado por seus aliados do “jeitinho” urdido (há controvérsias), ou demonstra que não tem controle nem mesmo sobre o PMDB que presidia até ontem.

 

A bronca pode não ter passado de um jogo de cena para tentar aplacar a ira do DEM e do PSDB, que já estava em pé-de-guerra com o Planalto e o PMDB, por conta da proposta de reajuste salarial para o STF. Aliás, perguntar não ofende, será que esse projeto também entrou nas negociações que atravessaram a noite de terça para quarta-feira? (Ontem mesmo, em sessão extraordinária após o impeachment, foi lido o pedido de urgência para essa proposta. Renan Calheiros prometeu votar o projeto ainda este mês.)

 

Ato contínuo, na contramão do acordão, outros dois ministros do Supremo criticaram duramente a decisão dos senadores e de Lewandowski. Com a enorme repercussão negativa do caso na mídia, o PSDB reviu mais uma vez sua posição; PV e PSD já haviam anunciado a mesma disposição de judicializar o caso.

 

É uma questão extremamente complexa, com opiniões favoráveis e desfavoráveis de juristas e até mesmo dentro do STF. Em tese, o Supremo não poderia interferir nas decisões políticas do Senado, que tem prerrogativa exclusiva para julgar os casos de crime de responsabilidade. Ocorre que os senadores podem ter suprimido, na canetada, parte de um artigo constitucional, sem emenda (PEC) e o quórum qualificado exigidos, com base apenas numa interpretação do regimento interno da própria Casa.

 

No entanto, por vezes a interpretação da legislação por parte do tribunal pode se mostrar maleável. Assim, não seria de se entranhar que a própria jurisprudência do Supremo, trazida dos tempos de Collor, sofresse alterações com esta nova composição da Corte. Ou não.

 

Em resumo, Michel Temer, ao contrário do que esperava com o fim de sua interinidade, começa a governar em meio a um ambiente de muita turbulência. Como venho alertando há tempos, existem ainda outros fatores que podem levar ao agravamento da crise, tais como Eduardo Cunha, a Lava-Jato, as ações para cassação da chapa Dilma/Temer no TSE, eleições municipais, etc.. Michel Temer terá de se exceder em sua capacidade e habilidade política para tentar estabilizar a situação e pacificar o País, a começar pela sua base aliada, pelo próprio PMDB, passando pelo Centrão até o PSDB e o DEM. Se é que esses dois últimos partidos continuarão mesmo a apoiá-lo depois dos últimos eventos, digamos, inesperados.

 

Temer tem pela frente votações difíceis, como, por exemplo, a renegociação da dívida dos Estados (aprovada na Câmara e que chega agora ao Senado), as reformas trabalhista e da Previdência, o teto para os gastos da União, etc.. Sem isso, o ajuste fiscal vai para o brejo.

 

Por tudo o que se viu, as incertezas ainda pairam sobre Brasília. Nas palestras para meus clientes, encerro sempre com uma frase atribuída ao ex-ministro da Fazenda Pedro Malan: “No Brasil, até o passado é incerto”.

 

É o caso concreto ora em voga, não, excelências?

 

Em tempo: dados os últimos acontecimentos, acho interessante reler um post que publiquei aqui, em 18 de agosto. O título, quase que premonitório, foi “Com o avanço da Lava-Jato, a crise política pode se aprofundar. Então, que tal uma anistia?”.

Em tempo 2: PSDB, DEM, PMDB e PPS decidiram também recorrer ao Supremo. Demorou.

Postado em: Política, Posts

Comentários

Uma resposta para “O que sobrou e o que vem por aí depois do impeachment?”

  1. Mauricio

    It is disgusting how the politicians just are interested on there issues to keep the power and are missing the point to bring the welfare to the people.

    1 de setembro de 2016 - 21:27 #

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