Os balões de ensaio e a Derrama

  • Por:Ibsen Costa Manso
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“Não existe arte que um governo aprenda do outro com maior rapidez do que a de extrair dinheiro do bolso da população.”

Adam Smith (1723-1790), em A Riqueza das Nações

 

A presidente Dilma Rousseff desistiu da ideia de recriar a CPMF, o chamado imposto do cheque. Com um dos índices de popularidade mais baixos da história recente do País e a base de apoio no Congresso em frangalhos, dificilmente conseguiria obter 3/5 dos votos dos parlamentares para aprovar emenda constitucional instituindo mais essa “contribuição” do povão, de quase R$ 80 bilhões, para ajudar a cobrir os gastos descontrolados do governo.

A CPMF foi criada em 1996, durante o governo FHC. Hoje, paradoxalmente, os tucanos são contra. Era para ser provisória, como diz o nome, e os recursos arrecadados investidos exclusivamente na área da saúde. O resto da história a gente conhece. À época, Lula dizia que esse imposto era para roubar o trabalhador. Quando chegou ao governo, o discurso mudou. Então presidente, disse que o mundo iria acabar com o fim da CPMF e a perda da arrecadação de cerca de R$ 40 bilhões para os cofres públicos.

Eu estava no plenário do Senado naquela manhã de 2007. Antecipei para meus clientes a informação da iminente derrota do governo, que viria a ser confirmada horas depois. O mundo não acabou. Simplesmente o governo aumentou a alíquota do IOF para 0,38%, a mesma da extinta CPMF. É mesmo muito fácil fazer mágica com o dinheiro dos outros.

E agora, o que fazer, já que não há condições políticas para aprovar um imposto que atingiria até mesmo quem recebe o Bolsa Família? (na região Nordeste, a avaliação positiva do governo Dilma caiu de 53% em dezembro, para 10%, em agosto)

Como ensinou Adam Smith, há séculos, certamente o governo tentará encontrar outros “jeitinhos” para compensar a queda de arrecadação, desta vez em decorrência do profundo processo recessivo que ele mesmo criou ― e que agrava ainda mais o desequilíbrio recorde nas contas públicas.

A primeira medida foi aumentar para 20% a CSLL (Contribuição Social sobre o Lucro Líquido, mais uma sigla da nossa sopa de letras tributária) cobrada dos bancos. A relatora da Medida Provisória, senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR, acusada de envolvimento na Operação Lava-Jato), propôs aumentar para 23% . Voltou atrás, diante da grita geral. A questão é simples: impostos são, normalmente, repassados para os consumidores e clientes. No caso dos bancos, o resultado será, provavelmente, aumento de tarifas e dos juros. Depois de 11 anos trabalhando como analista político para grandes empresas, investidores no Brasil e no exterior e o mercado financeiro em geral, comecei a entender um pouco melhor os dois lados do balcão. O argumento bonito do governo é taxar o lucro dos bancos. Na prática, quem paga a conta somos nós.

Sim, os banqueiros faturam demais. Que bom. Precisamos perder essa mania de que ser rico, ter lucro e sucesso é pecado. Quando os bancos quebram, o mundo afunda. Sim, os juros no Brasil são pornográficos. Fácil de entender também. Quase um terço do spread bancário são impostos. Outro tanto serve para cobrir a inadimplência. Ou seja, nós, os bons pagadores, pagamos também pelo caloteiro. O fato é que as instituições financeiras quase sempre ganham muito dinheiro, seja com juros altos ou baixos. É da natureza do negócio. Seja financiando a dívida impagável do governo (leia-se, nossa), ou pelo aumento exagerado do financiamento ao consumo, com juros bem baixinhos, como se viu recentemente. Deu no que deu.

Em outra frente, orquestra-se a cobrança de tributos sobre grandes fortunas e heranças. Não que isso seja significativo para o ajuste fiscal. É que todo dinheiro é bem-vindo e esses impostos tem um quê de Robin Hood, ao contrário da CPMF. A questão é que já existe um imposto estadual sobre heranças, o ITCMD, de 4%. Só quem perdeu um ente querido sabe como ele dói no bolso. O que está sendo proposto hoje é simplesmente pagar ainda mais, só que para a União. Tem gente que vai ser obrigada a vender os bens da família, conquistados durante anos de trabalho (com IR na fonte, diga-se de passagem), para quitar mais esta tunga da viúva federal.

No caso das grandes fortunas também há controvérsias. A tributação está prevista desde a Constituição de 1988 e até hoje não foi regulamentada. O que se pergunta é, o que deve ser considerado “grande fortuna”? Para a deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ) é um patrimônio acima de R$ 4 milhões (era de R$ 1 milhão no projeto original). Façam suas contas.

Obviamente ninguém pode ser contrário a taxar os ricos, criar um sistema tributário mais progressivo e distribuir renda. Hoje, por exemplo, o pobre paga os mesmos impostos que os ricos em um pacote de feijão. Esse é o ponto. O que precisamos não são mais impostos, mas sim de uma reforma tributária. A carga de tributos hoje no Brasil atinge quase 40% do PIB. Um absurdo, se observarmos a falta de infraestrutura e a má qualidade dos serviços prestados na saúde, educação, transportes, segurança, habitação, etc.. Além do mais, aumentar impostos significaria jogar ainda mais gasolina na fogueira da recessão. É um círculo vicioso.

É preciso também reformar o Estado, enxugar a máquina pública, diminuir os gastos e tornar a administração mais eficiente, combater a corrupção e a sonegação. Cortar investimentos e criar e/ou aumentar impostos são soluções fáceis, que se adotam com uma canetada nos gabinetes palacianos. Em outros tempos essas medidas já causaram revoltas, como a Inconfidência Mineira. De lá para cá, o brasileiro comum segue enforcado.

I.C.M.

(Publicado originalmente no LinkedIn)

Postado em: Política

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